Senadores da CPI das ONGs divergem sobre atuação do ISA na Amazônia

Senadores da CPI das ONGs divergem sobre atuação do ISA na Amazônia

Após diversas menções do nome do Instituto Socioambiental (ISA) em depoimentos anteriores à CPI das ONGs, o colegiado ouviu nesta quarta-feira (22) o presidente do Conselho Diretor da organização não governamental, Márcio Santilli. Os senadores questionaram sobre denúncias de irregularidades que envolveriam o instituto, entre elas falhas na prestação de contas, uso de recursos públicos, recursos recebidos do exterior e possível manipulação e exploração de indígenas.

O ISA foi fundado em 1994 e fechou o ano de 2022 com orçamento de quase R$ 70 milhões — segundo seu diretor — provenientes de 63 financiadores, dos quais 84% são doações estrangeiras e 16% de doadores nacionais.

— Nós trabalhamos com o conceito de que todas as nossas equipes têm funções finalísticas, de modo que 88% desse orçamento é aplicado em programas e projetos que têm a ver com as atividades fins do instituto — expôs Santilli.

Após exibir vídeo de sessão da CPI em São Gabriel da Cachoeira, em 31 de agosto, o presidente do colegiado, senador Plínio Valério (PSDB-AM), afirmou que os indígenas ouvidos criticam o ISA em seus depoimentos: “ora sendo acusado de enganar com falsas promessas, ora com até a suspeição sobre a orientação e laudos antropológicos”.

Sobre o atendimento, o diretor do ISA ponderou que são mais de 600 comunidades espalhadas por diversos rios formadores do Rio Negro.

— É evidente que não é possível o ISA e nenhuma outra organização de apoio poder atender a demanda de 600 comunidades de várias regiões, de vários idiomas diferentes. E a forma de poder trabalhar do ISA nessas regiões é através de relações de parceria com as associações e as organizações indígenas locais. Não há outra forma de nós podemos atender demandas, ainda que legítimas, que venham de indivíduos, de famílias, e é muito importante que a nossa organização atue de uma maneira formal, clara, transparente, através de termos de cooperação com essas organizações locais — expôs Santilli.

Recursos estrangeiros

Relator da CPI, o senador Marcio Bittar (União-AC) também contestou a moralidade da recepção pelo Instituto de mais de R$ 500 milhões em recursos estrangeiros, segundo Bittar, de países que são grandes emissores de gás carbônico.

— Vossa Senhoria não acha hipocrisia defender o fim das emissões enquanto é financiado por CO2? (…) Todos que vêm aqui das ONGs acham legítimo. É impressionante! “Não tem problema. O Brasil participa com pouco recurso desse montante de bilhões que circulam por aí para as ONGs. O Brasil participa com um pouco disso; então a maior parte é estrangeiro. Então acho que o deve, sim, captar”. É como se fossem todos santos captando recursos pra melhorar a qualidade de vida do amazônida e não são. É como se não houvesse contradição em receber dinheiro daqueles que mais poluem o planeta. E tudo que as ONGs apresentam são nichos — afirmou o relator.

Já a senadora Eliziane Gama (PSD-MA) apoiou as ações do ISA, afirmou que os povos das florestas têm de ser protegidos e que o Fundo Amazônia, que é fruto de acordos internacionais, tem de ser ampliado.

— Sabemos que os impactos ambientais, das mudanças climáticas, não são regionais. (…) Daí a necessidade desses acordos, da regulamentação do mercado de carbono — afirmou a senadora, que apoiou a captação de recursos estrangeiros.

Quanto ao campo da cooperação fundamentada em recursos concessionais, Santilli disse que o Brasil tem uma pequena participação, não superior a 5% dos recursos disponíveis em todo o mundo.

— E esses recursos nacionais também são disputados por organizações internacionais, que são organizações que fazem a coleta de fundos no mundo todo e fazem também no nosso país. (…) Não é só uma questão de necessidade, é uma questão fundamental de interesse do país que as organizações brasileiras que tenham capacidade de disputar editais, de disputar chamadas para projetos de organizações de outros países o façam, participem da disputa desses editais e procurem trazer uma pequena desse recurso para o nosso país.

Bittar lembrou que 251 pessoas já morreram, este ano, na Reserva Yanomami, mas que não há doações para os indígenas, como há para as ONGs.

— E a gente não encontra uma alma caridosa para doar R$ 60 milhões (valor doado para um fundo legal) lá diretamente para aquela comunidade, mas encontra uma alma generosa para doar 60 milhões de reais para uma ONG — disse o relator.

Contratos nacionais

Questionado pelo relator sobre contratos vigentes com o governo federal, ministérios e outros órgãos, o diretor negou qualquer fonte de recurso público nacional.

— Nós não mantemos contratos atualmente com o governo brasileiro e não recebemos recursos do governo. Nós temos termos de cooperação com alguns órgãos, que orientam os nossos trabalhos nas regiões onde nós atuamos, mas nenhum contrato que implique a transferência de recursos para o Instituto Socioambiental — respondeu o depoente.

Santilli informou que não há nenhuma relação de parceria formal do instituto com o IBGE, mas disse que o ISA participou de oficinas para ajudar na disponibilização de informações sobre os dados geográficos das terras indígenas.

Terras indígenas

Bittar afirmou que o objeto do ISA é “fundamentalmente a criação e manutenção de reservas de áreas indígenas”.  Santilli enfatizou que “terras indígenas são reconhecidas e não criadas”.

O senador Zequinha Marinho (Podemos-PA) criticou a busca por uma expansão de terras indígenas, de forma “desnecessária”, e questionou sobre a interferência do ISA na demarcação dessas terras.

— Se não fosse o ISA, o Pará não tinha 25% de terras indígenas. Nós temos hoje 10 terras indígenas em processo de criação e mais 37 requerimentos e nós temos cinquenta e poucos mil índios. Quer dizer, onde é que nós vamos arrumar tanto índio pra botar nessas terras? É terra demais pra índio de menos — afirmou Marinho.

Santilli disse defender o que está na Constituição: a demarcação de todas as terras indígenas no país e afirmou não haver influência da ONG nesse reconhecimento.

— Com relação a extensão das terras, 98% da extensão total das terras ficam na Amazônia Legal e outros 2%, nas demais regiões do país onde ficam 40% dos povos indígenas. Esses territórios foram reconhecidos nessa extensão porque se constatou a ocupação indígena nessas áreas — expôs o diretor.

Conflito

O relator também questionou a existência de “conflito moral e ético” na atuação da secretária-executiva adjunta do ISA, Adriana de Carvalho, que seria sócia de Santilli na Consultoria Ambiental Ltda e membro titular do conselho de administração do Fundo Amazônia.

Para o senador Bittar, há “uma questão imoral de pessoas que fazem parte de ONGs, ajudam a decidir políticas públicas e, ao mesmo tempo, captam recursos daquilo que ajudaram a decidir”.

— A Adriana Ramos não pertence mais ao Conselho Consultivo do Fundo Amazônia, não é deliberativo, não decide projetos, não decide a destinação de recursos, e ela é representante da sociedade civil brasileira assim como nós temos, nessa mesma instância — e continuamos tendo —, representações da Confederação Nacional da Indústria, da academia, de vários outros setores da sociedade — disse o diretor do ISA.